Reiner Kunze - Mestre do Silêncio
O silêncio pode ser um elemento importante na poesia, assim como a pausa na música, fato muito bem destacado na apresentação do livro de poemas do alemão Reiner Kunze, editado em Portugal em 1984 pela Editora Paisagem e com traduções de Luiz Vieira e Renato Correia: “uma das principais qualidades da lírica de Reiner Kunze é justamente a de mostrar que a poesia não é feita apenas do verbo, mas também de silêncio, que para encontrar a palavra necessária o poeta tem que saber calar a palavra supérflua (...) a perseguição infatigável da metáfora absoluta culminarão numa poesia medular, quase ascética, que subjuga pelo seu rigoroso laconismo”. Neste contexto, o poema abaixo, cujo título parece maior que o próprio poema, caracteriza bem o trabalho de Kunze (“Einladung zu einer Tasse Jasmintee - Convite para uma xícara de chá de jasmim”):
Treten Sie ein, legen Sie Ihre
traurigkeit ab, hier
dürfen Sie
schweigen
Entre, dispa a
tristeza, aqui
pode nada dizer
Outro exemplo da técnica de Kunze em que, segundo o tradutor Renato Correia, foram atingidos os limites da tradutibilidade está em “Möglichkeit, einen Sinn zu finden (für M.) - Possibilidades de Encontrar um Sentido (para M.)":
Durch die risse des glaubens schimmert
das nichts
Doch schon
der kiesel
nimmt die wärme an
der hand
Pelas brechas da fé transluz
o nada
Mas já o seixo
recebe o calor
da mão
O meu poema preferido deste livro é “Sensible Wege - Caminhos Sensíveis”, no qual Kunze se expressa pela ausência, brincando com os contrastes. Este poema foi publicado originalmente em 1969 e censurado, na época, pelo governo da Alemanha Oriental, devido às críticas de Kunze ao sistema político.
Sensible
ist die erde über den quellen: kein baum darf
gefällt, keine wurzel
gerodet werden
Die quellen könnten
versiegen
Wie viele bäume werden
gefällt, wie viele wurzeln
gerodet
in uns
Sensível
é a terra por sobre as fontes: nenhuma árvore pode
ser derrubada, nenhuma raiz
arrancada
As fontes podiam
secar
Quantas árvores
derrubadas, quantas raízes
arrancadas
dentro de nós
Comentários
Não conhecia o autor, mas adorei os poemas que você selecionou. E que tradução linda, hein?! Mesmo sem saber alemão, é impossível não reconhecer a beleza do texto em português:
"Pelas brechas da fé transluz o nada"
mas eqto ao Ferreira Gullar, amo ele!!!!
beijos
Gostei muito desse terceiro trecho que voce citou tambem, essa relação com a necessidade das raizes.
Obrigadissimo pela dica. Abraco grande. Chico
Escrevo para uma terra recém-secada, recém-
fresca de flores, de pólen, de argamassa,
escrevo para umas crateras cujas cúpulas de giz
repetem seu redondo vazio junto à neve pura,
opino ded imediato para o que apenas
leva o vapor ferrugino recém-saído do abismo,
falso para as pradarias que não conhecem nome
além da pequena campânujla do líquen ou o estame
queimado
ou a áspera mata onde se inflama a água.
(volto depois...)
Só acho uma de pena infinita que não tenhamos edições brasileiras de poesia tão bem cuidadas quanto as portuguesas... no máximo sai algo pela Cia das Letras ou Cosac Naif. O mercado editorial brasileiro de poesia tem muito a aprender com o pessoal da terrinha. :)
"De onde venho, senão destas primíparas, azuis
matérias que se enredam ou se encrespam ou se destituem
ou se esparzem a gritos ou se derramam sonâmbulas,
ou se galgam e formam o baluarte da árvore,
ou se somem e amarram a célula do cobre,
ou saltam ao ramo dos rios, ou sucumbem
na raça enterrada do carvão ou reluzem
nas trevas verdes da uva?"
De qualquer forma, sempre temos a internet que, afinal, sempre serve para alguma coisa.
e no meu tem um desenho totalmente louco!
beijossssssssss
desculpa eu te "encher" todos os dias mas nao somente o teu blog é super mas herdei voce de meu irmao...como amigo...espero..
mas tbem me imagino que ele nao te escreve ...escrevia tanto como eu...conheço ele...
outro beijo
"amigo K,
embora sua resenha, divulgação de O Livro Negro seja mais que perfeita peço licença para meter a lenha nos best sellers(?)de lingua não brasileira ,primeiro porque não acredito na tradução, pra traduzir do turco pro brasileiro tem que possuir a alma dos dois povos envolvidos,e pelo que vi trata-se de tradução de tradução, nada de bom pode surgir disso e em seguida acho que livros volumosos torram a paciência, pelo menos a minha,e pra concluir eu explodiria todas as editoras que nada cuidam de literatura e cultura, só editam pra encher o bolso com a grana gasta pela maioria "burra", desculpe mas eu sou um "grosso", temos escritores nacionais consagrados que só entram na lista dos mais vendidos pela mágica do esoterismo ou por serem luminares em outras paradas, não são escritores, são aproveitadores da fama, talvez haja alguma excessão, talvez,e você mesmo reconhece que temos bons escritores,pelo menos assim eu entendi ao ler seu post anterior, escrevi alguns livros,nada de obra proma, entanto um ou dois tem merecimento e pra concluir se eu fosse abonado eu compraria fácil - fácil a boa vontade mercenária de alguma editora e gastando mais grana a divulgação e distribuição seriam sucesso absoluto, e como tenho a felicidade de conhecer a fundo a lingua inglesa e francesa não leio nada traduzido, têm tantos imbecis metidos a tradutores, fora com eles e meu amigo K, me desculpe a ira incontida e um grande abraço pra você e mil obrigados pelos seus benevolentes comentários"
um grande abraçO!!!
algo incessantemente, rompendo, ultrapassando
a noite natatória, levantando as horas
para a luz, apalpando as secretas
imagens que a cal desterrou, subindo pelo bronze
até as cataratas recém-disciplinadas, e toco
em um caminho de rios o que não distribui
nada além da rosa nascida, o hemisfério afogado.
A terra é uma catedral de pálpebras pálidas,
eternamente úmidas e agregadas em um
vendaval de segmentos, em um sal de abóbadas,
em uma cor final de outono perdoado."
(voltairei depois)
Você manda.
"Não haveis, não haveis tocado nunca no caminho
o que a estalactite desnuda determina,
a festa entre as lâmpadas glaciais,
o alto frio das folhas negras,
não haveis entrado comigo nas fibras
que a terra escondeu,
não haveis tornado a subir depois de mortos
grão por grão os degraus da areia
até que as coroas do orvalho
cubram de novo uma rosa aberta,
não podeis existir sem ir morrendo
com o vestuário usado do destino.
Porém, eu sou o nimbo metálico, a argola
encadeada a espaços, a nuvens, a terrenos
que toca precipitadas e umedecidas águas,
e torna a desafiar a intempérie infinita.
Sds,
"Canto Geral"/
Pablo Neruda.
Vou publicar este útlimo nos meus poemas de sexta-feira, ok?
Abraço