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Mostrando postagens de fevereiro, 2022

Rosana Vinguenbah - Relatos insignificantes de vidas anônimas

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Rosana Vinguenbah - Relatos insignificantes de vidas anônimas - Editora Caos & Letras - 88 Páginas Projeto Gráfico: Cristiano Silva - Arte de Capa: Eduardo Sabino - Lançamento: 2021. Rosana Vinguenbah se afasta do cenário dos grandes centros urbanos, tão comum na literatura brasileira contemporânea, para criar narrativas nas quais os personagens são confrontados em regiões rurais, não claramente situadas no tempo e no espaço, com eventos de natureza fantástica em meio à rotina do cotidiano em um estilo inspirado pelo realismo mágico. O leitor logo perceberá a ironia do título, já que não há nada de insignificante nos contos, desde a transmutação de seres humanos em pássaros ou árvores até a comunicação com os mortos. Outra característica marcante no livro é a passagem do tempo,  um elemento comum em cada um dos dez contos desta antologia. A referência pode ser direta como em  "Herdeira do tempo", narrativa inicial que já coloca o leitor no clima da literatura fantástica a

Carlos Nejar - Contos de uma civilização envergonhada

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Carlos Nejar - Contos de uma civilização envergonhada - Editora Mais Um Livro - 226 Páginas - Capa e projeto gráfico de Cintia Belloc - Capa sobre detalhe de A Parábola dos Cegos de Pieter Bruegel - Lançamento: 2021. O título do mais recente lançamento do escritor, poeta, tradutor e imortal Carlos Nejar não poderia ser mais sugestivo para resumir a nossa época. Afinal, não há sentimento mais adequado do que a vergonha para definir a nossa perplexidade diante de uma civilização que não aprende com os próprios erros ao longo da história, seja por meio da destruição do planeta e seus recursos naturais ou, até mesmo, da autodestruição em guerras recorrentes, cada vez mais absurdas, como a recente invasão da Ucrânia pela Rússia que acompanhamos em tempo real. Os contos são de curta extensão, mas desafiadores em termos de construção literária e simbolismos, influência de autores como Franz Kafka e Jorge Luis Borges. Percebemos também ecos da experiência de Carlos Nejar como poeta, com uma pr

Marina Monteiro - Contos de vista, Pontos de queda

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Marina Monteiro - Contos de vista, Pontos de queda - Editora Patuá - 92 Páginas Capa e projeto gráfico de Roseli Vaz - Lançamento: 2021. Quando vivenciamos um acontecimento transformador, podemos  eventualmente  nos lembrar do clássico de Milton Nascimento: "Sei que nada será como antes, amanhã" . Esta é exatamente a sensação em cada um dos contos da mais recente antologia lançada por Marina Monteiro, na qual personagens são confrontados por situações-limite que não admitem retorno, seja na passagem da infância para a adolescência com a descoberta das sensações do póprio corpo em "O último verão"  (ler trecho abaixo) ou no excelente "Comigo ninguém pode" que, em oposição, descreve uma senhora na terceira idade, apegada à foto de sua planta na tentativa de manter alguma dignidade, enquanto é encaminhada pelo filho para uma casa de repouso de idosos. Em outras narrativas, a autora trata de questões de relacionamento além da ditadura hetero, abordando difere

Luciano Lanzillotti - Geometria do Acaso

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Luciano Lanzillotti - Geometria do Acaso - Editora Dialética - 144 Páginas Editoração de Sofia Souza - Lançamento: 2021. Só mesmo um poeta para nos ensinar que o acaso também tem lá a sua geometria, talvez não a rigorosa ciência que comprova a relação de cálculo das formas fixas, de seus comprimentos áreas e volumes, mas sim uma geometria na qual a matemática não tem vez, porque aqui tratamos de elementos não mensuráveis:  "[...] Há então a geometria do acaso, / embora não se encontre definição / em livros do gênero. // Por ela e só por ela / é possível compreender / que a vida não se mede, / a vida se gasta."  (p. 116) Na primeira parte do livro, Esfera , Luciano Lanzillotti trabalha com a inspiração do tempo que, assim como a memória, apesar da nossa teimosia em "juntar, medir e sistematizar", mostra-se inclassificável, fato que me lembra do clássico  Relógio de Ponto  e da prosa poética do  saudoso pernambucano Alberto da Cunha Melo (1942-2007). Em Pirâmide , o o

Cássia Penteado - Haikai

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Cássia Penteado - Haikai - Editora Reformatório - 104 Páginas - Imagem de capa e ilustrações internas de Mika Takahashi - Design e editoração eletrônica: Negrito Podução Editorial - Lançamento: 2021. O haikai é um poema curto de três versos que tem origem no Japão do século XVI com o monge budista Matsuo Bashô (1644-1694), na tentativa de capturar a brevidade de um momento de contemplação da natureza. No entanto, apesar das citações aos poemas de Bashô ao longo do livro, o que temos aqui não é uma obra de poesia e sim um romance; uma prosa delicada e breve como um haikai e, por outro lado, muito densa no sentido informativo, resultado de um intenso trabalho de pesquisa de Cássia Penteado sobre a cultura japonesa, incluindo a alta gastronomia e a arte da cerâmica, assim como a história e as tradições orientais. Tenho alguma experiência com a literatura japonesa e os costumes locais porque vivi durante um ano em Nagoya e o que mais me surpreendeu neste romance é que parece ter sido escri

Carine Mendes - Ponto Cego

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Carine Mendes - Ponto Cego - Editora Patuá - 160 Páginas - Projeto gráfico e diagramação: Luyse Costa - Ilustrações, capa e projeto gráfico: Gabriela Ferreira Mendes - Lançamento: 2021. Carine Mendes nos apresenta uma obra de caráter experimental que desafia o leitor a lidar com o próprio esgotamento da palavra, explorando a prosa e a  poesia, assim como recursos gráficos e ilustrações. O romance, se é que podemos chamar assim, tem como base as múltiplas identidades de um ser em formação, a partir de alguns poucos personagens  que nunca se definem completamente : Luíza, Luís e um misterioso narrador onisciente e onipresente, isolados em um vasto espaço negro, chamado de Lugar Nenhum , o ponto cego do mundo, uma região na qual os personagens estão todo o tempo protegidos pela escuridão mas, por outro lado, forçados a enfrentar os seus próprios conflitos. O livro de inspiração beckettiana em sua complexidade de interpretações, é dividido em quatro partes: fusão , espelhose , difração e