Arthur Cavalcante - Labirinto de Escombros

Literatura brasileira contemporânea
Arthur Cavalcante - Labirinto de Escombros - Edição Independente - 226 Páginas - Preparação do texto, capa e diagramação: Arthur Cavalcante - Lançamento: 2020.

Um romance que flerta com a metalinguagem e que me fez lembrar do estilo de Italo Calvino (1923-1985) em obras como Se um Viajante numa Noite de Inverno, o que definitivamente não é pouca coisa, diga-se de passagem. Em Labirinto de Escombros, o jovem escritor alagoano Arthur Cavalcante desdobra as narrativas e personagens em múltiplas histórias aparentemente sem nenhuma conexão, enquanto conduz o leitor com segurança até a saída deste labirinto literário, fazendo-o perceber que todo o tempo havia um fio de Ariadne ligando a trama.

Na primeira parte, um guia de turismo e seu cliente – que não segue as orientações básicas de segurança – se veem perdidos ao final de cinco dias de caminhada em um bosque, sem comunicação com a equipe de resgate. Enquanto o turista rebelde, Soren, lê em voz alta trechos de um misterioso livro sem título que traz consigo na mochila, o guia, não nomeado, narra uma operação recente de resgate, envolvendo um casal e o filho pequeno, desaparecidos naquele mesmo local. Aos poucos, as histórias se multiplicam, confundindo-se com as memórias do guia-narrador e criando a sensação de um labirinto ficional durante a leitura.

"Soren levanta-se com a mochila e desce pelo mesmo caminho. Com o pé firme e nivelado, aponto para noroeste, mas Soren dá as costas e pega a primeira entrada a sudeste, tomando a frente. Pela primeira vez, algo aperta dentro do meu peito enquanto acompanho a figura de Soren se afastar. É a primeira vez que sua afronta compromete o sucesso do trajeto. Uma coisa é o aventureiro insuportável querendo sair da rotina pré-definida pelo guia; outra, é o irresponsável que, prestes a terminar o longo percurso, improvisa na última hora. Caso atinja o limite de tempo contratado, basta eu pegar o rádio comunicador e avisar o ocorrido. A equipe me encontrará em alguns minutos via GPS e Soren – mesmo contra a vontade – será convidado a se retirar do bosque." - Trecho da primeira parte (p. 12)

Durante a segunda parte do romance, o foco narrativo se concentra na história de outro narrador que passou por uma infância difícil em um orfanato, sofrendo bullying de um colega chamado Maurício. Este personagem, com quem o leitor se identifica prontamente, só encontra algum consolo no mundo da fantasia que ele encontra nos livros, aprendendo que a imaginação sempre nos transforma em pessoas melhores ao estimular o senso de empatia.

"Ele foi até o final do livro, abrindo com cuidado a última página para não receber uma revelação do enredo. Apenas queria verificar o tipo de papel utilizado e a minibiografia do autor. Além, claro, do maravilhoso mapa daquele mundo de fantasia. Uma ilustração detalhada, rica no traço, mostrando o posicionamento das cidades, a divisão territorial da civilização e o fluxo de montanhas e rios. Pegando a folha de caderno ao lado, agarrou o lápis e tentou fazer um desenho parecido com o mapa. Quando ele desenhava cada elemento, sentia como se ele próprio fosse um grande criador, uma espécie de Deus. Fez um círculo quase perfeito e rabiscou montanhas no formato de 'V' invertido. Para os rios, traçou pobremente linhas aleatórias, improvisando deltas à margem. No fim, reconheceu a simplificação. Se alguém visse aquele desenho, teria certeza de ser uma criança sem coordenação motora a responsável." - Trecho da segunda parte (p. 100)

Na terceira parte, fica mais nítida a imagem do verdadeiro narrador e os dramáticos eventos do seu passado com base na tragédia familiar que ocorreu no mesmo bosque. A chave para a conexão de todas narrativas, assim como o entendimento da trama como um todo, só será concedida ao leitor na quarta parte. Um romance forte e original que trabalha com a memória e as perdas que sofremos ao longo da vida, inspiração de toda verdadeira literatura.

"Seguindo o conselho de Renata, eles fizeram uma viagem pelo interior do estado. Acamparam numa área de árvores imensas, feito um bosque milimetricamente arquitetado para deixar os visitantes boquiabertos com tanta beleza. Com um estrondo ouviu um pássaro alçar voo na copa de uma árvore, mas não conseguiu acompanhá-lo, nem saber a origem do som. A família fazia piqueniques com Adalberto correndo ao redor da toalha que servia de mesa, e Daniel nos braços de Renata ria sem entender o que o irmão aprontava. / O destino realmente pregava peças. Onde estariam seus antigos colegas do orfanato? O que pensaria Maurício ao vê-lo naquela situação tão perfeita?" - Trecho da terceira parte (p. 180)

Sobre o autor: Arthur Cavalcante nasceu em 1989, em Arapiraca, Alagoas. Viveu a vida inteira em Marechal Deodoro e atualmente mora em Natal com a esposa. Trabalha como professor de Escrita Criativa e de Roteiro no IFRN. Coordena o projeto Sala dos Escritores, no qual desenvolve com os alunos narrativas para diversos meios. É autor do romance "Mestre de Guerreiro: entre a coroa e a flecha" (Pandorga, 2018), além de outros contos publicados.

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