Genki Kawamura - Se os gatos desaparecessem do mundo
Um solitário e jovem carteiro recebe o diagnóstico de uma doença em fase terminal com, no máximo, seis meses de vida, ou talvez até uma semana. Entretanto, pouco depois, vem o Diabo, usando uma camisa havaiana amarela, short e óculos escuros, apresentando uma inusitada proposta: para cada coisa que ele estivesse disposto a fazer desaparecer do mundo, ganharia um dia extra de vida. Como bem sabemos, toda troca oferecida pelo maligno sempre esconde algum tipo de tapeação e o protagonista logo terá que enfrentar um grande dilema existencial. Este é o argumento do romance de estreia de Genki Kawamura, traduzido para dezoito idiomas e com mais de dois milhões de cópias vendidas no mundo.
A questão é que, ao longo de uma semana, as escolhas das coisas que deveriam desaparecer, aparentemente escolhas simples já que existem tantas coisas inúteis no mundo, acabam se tornando difíceis, principalmente quando são impostas pelo ardiloso Diabo e colocam em risco a vida do amado gato Repolho. O livro nos faz refletir sobre o que realmente importa e nem sempre percebemos no devido tempo, a constatação óbvia, mas sempre ignorada, de que para ganhar alguma coisa é necessário perder algo. Por exemplo, o que aconteceria se os celulares desaparecessem do mundo? E se os filmes desaparecessem do mundo? Até entendermos a pergunta mais difícil: e se eu desaparecesse do mundo?
"Só recapitulando: ao fazer uma coisa desaparecer, eu ganharia um dia de vida. Pelas minhas contas, trinta coisas me dariam um mês. Então trezentas e sessenta e cinco me proporcionariam mais um ano. Que fácil! O mundo estava cheio de porcaria mesmo. Salsa na omelete, lenços de papel distribuídos em frente às estações de trem, manuais de eletrodomésticos que pareciam calhamaços e semente de melancia. só de pensar um pouco, já consegui enumerar diversas coisas desnecessárias. Se organizasse direitinho, a lista com certeza passaria de um milhão. / Partindo do pressuposto de que eu viveria até os setenta anos, e levando em conta minha atual idade, teria apenas quarenta anos pela frente. Então, se eu fizesse sumir umas 14.600 coisas, conseguiria viver até essa idade. Se bem que havia tanta coisa para fazer desaparecer que eu conseguiria seguir com isso por muito tempo, e viveria talvez até os cem ou duzentos anos. Como Aloha afirmara, a humanidade vinha criando um monte de objetos inúteis por milhares de anos. Se alguma coisa desaparecesse, ninguém notaria e, além disso, o mundo se tornaria um lugar mais simples, e com certeza as pessoas ficariam gratas por isso." (p. 22)
Até que não seria tão mal se os celulares desaparecessem do mundo, não é verdade? Com uma linguagem precisa, característica dos autores japoneses contemporâneos, Genki Kawamura conduz a sua narrativa em primeira pessoa, utilizando um tom confessional e bem-humorado que provoca empatia e identificação no leitor. Um livro sensível sobre vida, amor, família e morte, que pode ser resumido em uma frase de Charlie Chaplin, citada em certo ponto pelo protagonista: "A vida é uma tragédia vista de perto, mas uma comédia vista de longe."
"Em meus trinta anos de vida, será que fiz alguma coisa significativa? Havia passado tempo com as pessoas de quem realmente gostava? Havia falado tudo que queria dizer às pessoas que eram importantes para mim? No geral, eu estava mais preocupado em jogar conversa fora com outras pessoas ao telefone do que em ligar para minha mãe. Deixei de lado o que importava de verdade para dar atenção a coisas insignificantes. Ocupado com o cotidiano, perdi um tempo precioso que poderia ter sido dedicado a quem eu amava. E nem ao menos percebi isso. Se eu tivesse parado por um momentinho para refletir sobre as coisas, ficaria óbvio quem era mais importante na minha vida. [...] Sempre vivi pensando no amanhã, provavelmente jurando que era imortal. Mas, desde que soube que morreria em breve, passei a ter a sensação de que era o futuro que vinha na minha direção. Meu destino já estava traçado – ou ao menos esse era o sentimento que eu tinha Que irônico! Só depois de terem dito que me restava pouquíssimo tempo de vida e de me ver num mundo onde o tempo não existia, que eu havia parado para pensar no futuro e no que ele reservava para mim." (p. 114-5)
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