André Luiz Pinto - Balanço - Poemas reunidos (1990-2020)

Poesia brasileira contemporânea
André Luiz Pinto - Balanço - Poemas reunidos (1990-2020) - Editora Patuá - 276 Páginas - Capa, projeto gráfico e diagramação de Alessandro Romio - Lançamento: 2021.

O livro é uma coletânea de poemas de André Luiz Pinto cobrindo um período de 30 anos (1990-2020), dividido em 13 partes, cada uma com seleções de diferentes livros. Logo, não se trata de reunir todos os poemas publicados ao longo do tempo, mas sim (re)ordená-los segundo uma nova distribuição temática, como bem explicado no prefácio de Diana Junkes: "Inseridos num conjunto rememorativo e celebrativo dos trinta anos de atividade, cada poema terá seu corpo e voz, mas esta voz ganha outro timbre, um novo balanço, ao mesmo tempo que, sendo parte de uma memória, é eco e silêncio, traz neste timbre um resto de percurso, um lastro de desejos recônditos, amargo e sublime – no que pode ser sublime para um poeta cerebral, filosófico e bastante afetivo com as coisas mais simples da vida, com os laços pequeninos entre os seres."

O único poema inédito do livro mostrou-se uma escolha acertada para a epígrafe, assumindo o estilo tradicional de narrativa em primeira pessoa, coloquial, tão constante nos versos de André Luiz Pinto e revelando, ao mesmo tempo, um compromisso de toda a vida na surpresa da imagem figurada, que compara a poesia com um cachorro fiel que o segue pela rua: "Quando nos mudamos, / meus pais fizeram de tudo / para se livrar da mochila / que levava meus poemas. // Botaram-na perto da portinhola / da caminhonete para ver se caía na estrada. // Mas não caiu. Desde então, / levo essa mochila comigo / como um cachorro / que me segue na rua."

Na primeira parte, Pessoa, o antipoema de abertura, "Prazer, esse sou eu", é uma espécie de apresentação ou declaração de intenções do poeta, publicado em Mas valia (Editora 7Letras, 2016) e no excelente e indefinível Migalha (Editora 7Letras, 2019), fica logo claro o teor de crítica social e também autobiográfico que se repetirá em outros poemas inspirados na família em um contexto de dramatização. No posfácio de Alberto Pucheu, este poema é analisado em detalhes e percebemos as diferentes camadas que demandam mais de uma leitura para a completa percepção dos versos que parecem se acomodar, vencido o estranhamento inicial do leitor.

Prazer, esse sou eu
filho de doméstica
numa época em que
patrões cismavam
em chamar de filhas
as mucamas. Eu
criado numa mansão
da Barra, obrigado a amar
patrões como avós
sem direito de herança.
Uma coisa aprendi:
a ler livros e a me irritar
com facilidade – lá, onde
o sinal está vermelho
e sempre acabo errando 
a baliza – onde ninguém
divide nada, quando
até quem te chamou de sobrinho
diz um dia: a casa é nossa
deves partir. Tá bom, disse.
Só me dá duas semanas.

Em Brasis, novamente recorro ao prefácio de Diana Junkes: "O plural brasis poderia sugerir a multiplicidade e a pluralidade que constituem o país, mas ao contrário, denunciam a reiteração da injustiça e da pobreza [...]", nesta parte do livro a politização é ainda mais forte: "Moço tá nervoso. / Dá pra ver. / Serve um cafezinho. / Pega uma fatia de bolo em cima do balcão. / As coisas andam estranhas por aqui. / Nem acabou o ano e já começou um outro. / E o medo que o senhor diz que tem / quem é que não tem?" A violência dos grandes centros urbanos fica flagrante neste outro poema de Migalha, que nos apresenta o esquartejamento do poeta:

Fiz como você pediu
cortei o poeta
em versos
em um prédio abandonado
numa caixa d'água vazia
pra ninguém saber

Já em Assim, a maioria dos poemas vem dos livros: Ao léu (Editora Bem-te-vi, 2007) e Nós, os dinossauros (Editora Patuá, 2016), uma sensação de melancolia ou "uma poética do desamparo, uma poética do desabrigo...", como resume Alberto Pucheu, também nesta passagem: "Há uma perda, uma exclusão, um deixar de fora, uma quebra, uma tristeza, uma dor, uma rascância assumidas nesses poemas que, impulsionados por elas, querem desdobrá-las, dar-lhes voz, afetos, linguagem, pensamentos." E quem não tem dias assim, sem dormir, dias que nos fazem ter saudade dos pesadelos...

No manequim detrás da vitrine
ou em algum banner
como propaganda
de cabeleireiro.
Está também
na mãe buscando atendimento;
mesmo na tv
quando se assiste
o congresso:
são dias sem dormir
e que saudade dos pesadelos.

Em Paisagens, o olhar do poeta destaca momentos e cenários despercebidos no cotidiano, matéria menos poética não há, será mesmo?: "Volto para casa. / A Washington Luiz está boa. / O inverno segue no aclimatado do ônibus. / Quando se está na estrada / a gente se desculpa até do passado, / dá como que uma volta, cheio de interrogações / Está seguro? Chegará a salvo? / O vento que se vê nas árvores ao fundo. / De encontro ao vidro / a minha respiração."

"É preciso ter a fé de que nada vai dar certo / para escrever / como se fosse", segredos da mágica da composição, do exercício de fazer poesia, publicado no livro Terno Novo (Editora 7Letras, 2012), está presente em Palavra, assim como o poema Justificativa do seu livro de estreia Flor à margem (Edição particular, 1999): "Eu plagio / porque não inventaram / coisa melhor". Um livro recomendado, vale a pena conhecer a poesia de André Luiz Pinto.

Poemas não pedem para nascer.
Deslocam o ponteiro daquilo que funciona.
Cinco dedos são insuficientes
muito menos uma cabeça para pensar.
Para fazer um poema funcionar,
ausenta-se de todas as regras
bota o coração na ré.
É preciso ter a fé de que nada vai dar certo
para escrever como
se fosse.

Sobre o autor: André Luiz Pinto da Rocha nasceu em 1975, Rio. Doutor em Filosofia pela UERJ, leciona na FAETEC e SEEDUC-RJ. Casado com Cristina da Silva Melo, é pai de Tales Melo da Rocha.

Onde encontrar o livro: Clique aqui para comprar Balanço de André Luiz Pinto

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