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Mostrando postagens de maio, 2023

Sandra Godinho - A secura dos ossos

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Sandra Godinho - A secura dos ossos - Editora Patuá - 184 Páginas - Capa: Maria Carolina Godinho - Introdução de Mikael de Souza Frota - Lançamento; 2022. O romance mais recente de Sandra Godinho demonstra a maturidade atingida pela autora após uma curta e intensa carreira literária. De fato, alguns de seus premiados livros anteriores, tais como:  Tocaia do norte , A morte é a promessa de algum fim e Estranha entre nós , parecem ter pavimentado o caminho para a importância e urgência desta obra, na qual, mais uma vez, o registro histórico é a base de toda a construção ficcional. Em A secura dos ossos , finalista do Prêmio Leya 2022, o Massacre de Haximu, ocorrido em 1993, é revisitado com sensibilidade e lirismo, mas sem omitir a brutalidade da execução de homens, mulheres e crianças do povo indígena Yanomami que habitavam a região montanhosa de fronteira entre Brasil e Venezuela. A narradora-protagonista,Tainá Terra, busca compreender porque foi abandonada pela mãe, Amana Terra, aos

Jorge Sá Earp - O fio da seda

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Jorge Sá Earp - O fio da seda - Editora 7Letras - 168 Páginas - Lançamento: 2023 O mais recente lançamento de Jorge Sá Earp é um sensível romance de formação com base nas suas memórias da infância até a adolescência. Na primeira parte, apesar da narrativa em terceira pessoa, os fragmentos das lembranças escapam do autor como um fluxo de consciência, revelando o que ficou marcado na mente da criança que viveu na casa em Lages, Santa Catarina: as histórias que a mãe lhe contava, a convivência com a Babá e o tio-avô, o urso Zé de textura macia e olhos pretos de botão que o protegia do gigante da cortina, assim como os seres que habitavam o quarto, personagens formados por tecidos, almofadas e tudo que a imaginação infantil pudesse criar. No romance, o autor empresta as suas memórias para o protagonista Igor, obedecendo a uma sequência não exatamente linear, ditada mais pela emoção do que pela lógica, a narrativa avança ao longo dos anos sessenta para outras residências onde a família moro

Lilia Guerra - Amor avenida

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Lilia Guerra - Amor avenida - Editora Patuá - 312 páginas - Capa e projeto gráfico: Roseli Vaz - Lançamento: 2022. Primeiro romance de Lilia Guerra, publicado originalmente em 2014, Amor avenida está sendo relançado agora pela Editora Patuá, um livro que assim como os mais recentes – a antologia de contos Perifobia e o romance  Rua do Larguinho –,  também aborda o tema das mulheres negras excluídas, sobrevivendo nas comunidades carentes das periferias dos grandes centros urbanos brasileiros. Contudo, em Amor avenida a miséria extrema é apresentada nos seus aspectos mais cruéis, infelizmente perpetuados pelo preconceito e o racismo estrutural da nossa sociedade, evidenciados a partir das ações (ou falta de ações) do Estado e das instituições oficiais no acesso diferenciado aos serviços públicos básicos, tais como: segurança, saúde, educação e justiça.  O romance tem como base a trajetória de Viviana que, sem condições de se manter no interior após ter sido abandonada pelo marido, e

Julia Barandier - Bakken

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Julia Barandier - Bakken - Editora 7Letras - 184 Páginas - Lançamento: 2022. O romance de estreia de Julia Barandier surpreende pela segurança na utilização de diferentes técnicas narrativas, tais como o gênero textual diário, fluxo de consciência e até mesmo poesia, apresentando ao leitor  a improvável amizade de dois homens solitários de meia-idade em busca de algum tipo de compensação na arte para lidar com suas perdas emocionais. Portanto, trata-se de um livro desafiador tanto na forma quanto no conteúdo e no qual, adicionalmente, não podemos acreditar nas pistas que os personagens pouco confiáveis revelam, formando a nossa própria versão a partir dos múltiplos pontos de vista e fragmentos narrativos. Antônio, um arquiteto brasileiro, após o divórcio decide recomeçar a vida em Copenhagen, Dinamarca, passando a escrever cartas para Marta sua ex-esposa que nunca são enviadas; textos que se transformam em uma espécie de diário, conectando passado e presente. Antônio logo conhece Hans,

Adriane Garcia - A bandeja de Salomé

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Adriane Garcia - A bandeja de Salomé - Editora Caos & Letras - 160 Páginas - Arte de capa: Iara Ariel - Edição bilíngue, tradução para o espanhol de Manuel Barrós - Lançamento: 2022. Apresentando um conceito semelhante aos poemas reunidos em Eva-proto-poeta , este mais recente lançamento de Adriane Garcia também seria em outros tempos um ótimo candidato à fogueira, juntamente com sua autora, condenada por questionar os dogmas de uma religião estabelecida sobre estruturas patriarcais. De fato , principalmente no Antigo Testamento, a bíblia perpetua uma espécie de legitimação para a dominação masculina com base em narrativas cruéis nas quais o modelo de submissão da mulher é exaltado como exemplo moral e validado por uma antologia de textos que justificam muitas vezes a exploração sexual e o feminicídio. Curiosamente, nas versões propostas por Adriane Garcia, as parábolas bíblicas recontadas do ponto de vista feminino ganham em sensibilidade, sem prejuízo da mensagem religiosa que pa

Pedro Augusto Baía - Corpos benzidos em metal pesado

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Pedro Augusto Baía - Corpos benzidos em metal pesado - Editora Record - 112 Páginas - Foto de capa: Carambela de Rao Godinho - Lançamento: 2022 Os contos do livro de estreia do paraense Pedro Augusto Baía, vencedor do prêmio Sesc de Literatura edição 2022, têm como elemento de ligação a rotina de violência e destruição que domina a região norte do Brasil nos últimos anos. As narrativas demonstram o avanço do garimpo ilegal, impulsionado pela omissão do poder público na fiscalização para proteção do meio ambiente e dos povos indígenas, assim como a desigualdade social que perpetua o cenário de devastação atual, sem apresentar opções dignas de sobrevivência para a população local, restando apenas a migração.  O regionalismo do autor assume um tom de urgência e denúncia, contudo sem perder o lirismo do texto literário ao aproximar ficção e realidade. Em Tanimbuca , uma árvore emergente brasileira nativa da Amazônia, cuja madeira tem valor comercial, a motoserra assume um protagonismo que