Raphael Montes - Dias perfeitos

Literatura brasileira contemporânea
Raphael Montes - Dias perfeitos - Companhia das Letras - 280 Páginas - Capa: Retina 78 - Lançamento: 2014.

Raphael Montes surpreendeu público e crítica quando lançou em 2012, com apenas 20 anos, seu primeiro romance de suspense policial, Suicidas, finalista dos prêmios: Benvirá de Literatura (2010), Machado de Assis (2012) e São Paulo de Literatura (2013). Dias perfeitos, lançado em 2014 foi o segundo romance na carreira do autor e também se tornou um sucesso imediato de vendas e direitos de tradução negociados com 22 países, consolidando um estilo vibrante de diálogos velozes e precisos, assim como temas violentos e muitas reviravoltas, sem que o leitor consiga interromper a leitura do início ao final do livro.

Em Dias perfeitos acompanhamos em detalhes as decisões na mente de um protagonista psicopata que, em nome de um amor mórbido, justifica com uma lógica fria e calculista todos os meios para atingir seus objetivos. Téo é um estudante de medicina de 22 anos que vive com a mãe paraplégica e não tem amigos ou namorada. A única relação afetiva que conseguiu manter até o momento foi com o cadáver de uma mulher desconhecida nas aulas de anatomia, apelidada por ele mesmo de Gertrudes. No entanto, a vida de Téo está para mudar radicalmente quando ele conhece e se torna obcecado por Clarice, uma jovem que cursa história da arte e escreve um roteiro chamado Dias perfeitos, um road movie sobre três amigas que viajam de carro em busca de aventuras. 
"Gertrudes era a única pessoa de quem Téo gostava. Desde o primeiro momento, ele soube que os encontros com ela seriam inesquecíveis. Os outros alunos não ficavam tão à vontade. Mal entravam na sala, as meninas tapavam o nariz; os rapazes buscavam manter alguma postura, mas o olhar revelava o incômodo. Téo não queria que notassem como se sentia bem ali. Andava de cabeça baixa, passos rápidos até a mesa metálica. [...] Em sua companhia, a imaginação não tinha limites. O mundo desaparecia e só restava ele. Ele e ela. Gertrudes. Havia escolhido o nome no primeiro encontro, ela com as carnes ainda no lugar. A relação se estreitara durante o semestre. A cada aula, Téo fazia descobertas: Gertrudes adorava surpreendê‑lo. Aproximava‑se da cabeça — a parte mais interessante — e extraía conclusões. A quem pertencia aquele corpo? Seria mesmo Gertrudes? Ou teria um nome mais simples?" (pp. 9-10)
A obsessão de Téo por Clarice fará com que ele tome uma série de decisões de caráter violento, mantendo-a algemada e sedada quando necessário, sempre com a sua lógica imperturbável ele vai cometendo as maiores atrocidades contra a sua amada e as outras pessoas envolvidas que possam interferir com seus planos. Refazendo o mesmo percurso do roteiro de Clarice, ele passa algum tempo com ela em um chalé em um hotel chamado Hotel Fazenda Lago dos Anões, localizado em Teresópolis, e em uma casa isolada na Ilha Grande.
"Ele buscou uma maçã e uma faca pequena na cozinha. Fatiou a fruta, pedindo a Clarice que mastigasse devagar e tomasse cuidado para não engasgar. Ela não comia desde o dia anterior, e ele não queria vê-la murchar por sua causa. Zelar pela saúde do outro era essencial em um bom relacionamento. Serviu-lhe meia maçã: ela mastigava com os lábios, deixando escorrer um filete de saliva pelo queixo e pelo pescoço. Téo enxugou o queixo de Clarice e pediu que comesse direito. Caso necessário, poderia servi-la para sempre. Gostava de vê-la comer aos pouquinhos, tão carente de cuidados. Como também estava com fome, comeu a outra metade da maçã. [...] Clarice não estava calma. Agitava o corpo, tomada de raiva. Falava alto e de um modo grosseiro que o afugentou. Ele teve que usar a força para dominá-la. Prendeu uma algema em seu punho e outra no bíceps, impedindo que ela movesse o braço. Contrariado, injetou nova dose de Thiolax – dessa vez no braço esquerdo, pois o direito apresentava um disforme círculo roxo da aplicação anterior." (p. 63)
Apesar deste tipo de relação amorosa, com altas doses de psicopatia, já ter se transformado em uma espécie de clichê, principalmente no cinema, o romance tem muitos méritos, sendo um bom exemplo de literatura de entretenimento com competência narrativa. Após as perdas recentes de Rubem Fonseca e Luiz Alfredo Garcia Roza, dois dos maiores escritores da literatura policial brasileira e, sem querer fazer comparações injustas, o futuro do gênero em nosso país tem em Raphael Montes um dos seus maiores expoentes.

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