a máquina de fazer espanhóis - valter hugo mãe

Literatura portuguesa contemporânea
a máquina de fazer espanhóis - valter hugo mãe - Editora Cosac Naify - 256 páginas - Ilustração da capa e apresentação de Lourenço Mutarelli - Lançamento 2011. 

Mais um grande romance de valter hugo mãe, assim mesmo em minúsculas, como é de gosto do autor, angolano, radicado em Portugal e vencedor do Prêmio Literário José Saramago de 2007. Um romance daqueles que deixam saudade e pena de chegarmos ao final, mesmo tratando de um tema tão difícil quanto a chegada da terceira idade. Esta é a história de antónio jorge da silva, um barbeiro que acaba de completar 84 anos e que, depois da morte da mulher, é abandonado em um asilo pelos filhos. Os primeiros dias representam para o protagonista um lento processo de desintegração, chocado pela perda da sua companheira de toda a vida, ele se sente desamparado e sem esperanças em um mundo que parece ter perdido o objetivo, a não ser a lenta e solitária passagem do pouco tempo que lhe resta.

No entanto, valter hugo mãe consegue, com muita sensibilidade, mostrar o poder de renovação e adaptação da vida. Através de personagens como o centenário esteves "sem metafísica" que teria inspirado Fernando Pessoa a escrever o poema “Tabacaria”, um fio condutor de toda a narrativa, com o qual consegue nos mostrar que é possível alguma alegria para a nova realidade de seu atormentado protagonista na descoberta tardia do valor da amizade. Como valter hugo mãe consegue, com menos de quarenta anos, descrever com tanta credibilidade as sensações de um velho na terceira idade é um mistério. Muito mais direto e cativante para o leitor do que "o remorso de baltazar serapião", este romance fala direto ao coração sem necessidade de maiores explicações.

No decorrer da narrativa, o nosso silva vai se lembrando de algumas passagens de sua vida que se confundem com a história de Portugal na segunda metade do século XX, o regime de ferro de Salazar e a revolução de 1974, fazendo com que o romance possa ser interpretado também como  uma grande metáfora para a situação atual de Portugal que, segundo o autor, teria se transformado em uma "máquina de fazer espanhóis" devido à situação de desigualdade econômica com o seu vizinho na União Europeia. Em nosso país, podemos entender este sentimento com clareza já que somos também uma máquina de fazer americanos, alemães, italianos e qualquer outra nacionalidade que ofereça condições de sobrevivência mais dignas.

Comentários

Gerana Damulakis disse…
Ótima resenha para um ótimo livro.

Não vejo a hora de encontrar aqui a resenha para Claraboia, de Saramago. Amei!!!

Nós dois, tão leitores, poderíamos elaborar uma lista com nossas melhores leituras em 2011. Que tal?
Anônimo disse…
eu gostei muito d'A Máquina de Fazer Espanhóis, Kovacs, embora tenha achado a narrativa uma versão mais leve de "Até o Fim", do Virgílio Ferreira.

de todo jeito, foi um dos pontos altos do meu ano de leitura.
Alexandre Kovacs disse…
Gerana, os dois que li este ano de valter hugo mãe: "o remorso de baltazar serapião" e este "a máquina de fazer espanhóis" já fazem parte da minha lista de melhores leituras em 2011.

Quanto a "Claraboia" de Saramago está na fila, mas deverá ficar para 2012!
Alexandre Kovacs disse…
Quinas e Cantos, ainda não li "Até o Fim" de Virgílio Ferreira, mas fiquei curioso agora!
N. Martins disse…
Acabei de o ler e também gostei muito. Mudou um pouco a minha forma de olhar para a terceira idade... :) Tenho lido maravilhas do "O Remorso de Baltazar Serapião", provavelmente o próximo que vou ler dele.
Alexandre Kovacs disse…
N. Martins, obrigado pela visita e comentário!
nostodoslemos disse…
Grande, literalmente falando!
Alexandre Kovacs disse…
Lígia, é uma ótima indicação de leitura para o final de ano.
Anônimo disse…
Kovacs, você me convenceu. Vou ler. Reconheço que andei puxando essa leitura para o lado. Passei cinco anos cuidando de minha mãe, em minha casa,até ela morrer há 3 anos. E a perspectiva de voltar a enfrentar os sentimentos que me invadiam o dia a dia ao vê-la, completamente consciente, ter que ir se acomodando a uma vida de restrições estabelecidas pela idade e no caso dela por uma doença terminal, me levaram a deixar essa leitura para mais tarde. E mais tarde... e mais tarde... Mas agora a minha curiosidade foi aguçada. Depois comento com você o que achei. Como sempre ótima postagem!
Alexandre Kovacs disse…
peregrina, segundo valter hugo mãe declarou, este romance é dedicado ao pai dele que não alcançou a terceira idade. O tema é pesado e difícil, mas o autor consegue inserir alguns raios de esperança com humor e muita sensibilidade (sem cair no lugar comum), um livro imperdível.
Lia Noronha disse…
Td maravilhoso por aqui...saudades suas no meu Cotidiano.
bjinss
Alexandre Kovacs disse…
Lia Noronha, obrigado pela visita e comentário.

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