Simone Teodoro - Também estivemos em Pompeia
Simone Teodoro - Também estivemos em Pompeia - Editora Patuá - 120 Páginas
Ilustração, Projeto gráfico e Diagramação de Leonardo Mathias - Lançamento: Julho/2019.
Ilustração, Projeto gráfico e Diagramação de Leonardo Mathias - Lançamento: Julho/2019.
Em seu terceiro livro de poemas, depois de Distraídas Astronautas (Patuá, 2014) e Movimento em Falso (Patuá, 2016), Simone Teodoro volta a expressar o sentimento do poeta em permanente estado de inadequação em seu tempo e espaço, tristeza e solidão. Afinal, como não ser triste "Quando os brutos / chupam o tutano das costelas dos mansos / em mesas fartas?", ou ainda "Quando os simples / são atirados em compactadores de lixo / quando o chorume é o cheiro do mundo?" (O Baú I, p.45). No entanto, a literatura é uma forma de resistir.
Lendo os poemas de Simone, escuto os ecos dos gritos de outras mulheres no passado que também souberam transformar a dor em poesia, mulheres como Sylvia Plath, Elizabeth Bishop, Ana Cristina Cesar e Hilda Hilst, assim como a influência da tradição poética nas raízes do simbolismo francês nos versos de mestres como Rimbaud, Verlaine e Baudelaire. Não é pouca coisa. Adriane Garcia lembra, na apresentação do livro, como escrever sobre a dor pode significar também uma forma de libertação, que assim seja então.
Exortação a uma Loba Filhote
Não chore
pequena Loba
pelos teus pássaros apodrecidos
Nem enlouqueça quando os vermes
violarem o azul de teu verão mais bonito
É da natureza dos muros
existirem para atrair o musgo
assim como o sentido da chuva
é engendrar a lama
para decompor a vida
Apenas golpeie
com punhos
ou rosas
golpeie
Não se esquive de causar assombro
como um trecho de sinfonia
E acima de tudo
goze
pequena Lobo
como se
inteiro
um sol ardesse
em teu
útero
Não se espante com as múltiplas referências que podem abranger desde uma conversa com Drummond, intercalada com uma canção de Morrissey no mesmo poema (Cheiro forte de ferro e náusea, p. 59), até uma homenagem ao grande prosador surrealista (e tão esquecido) Murilo Mendes: "Nunca soube andar só, Murilo / Minha existência tem sido / um tropeçar contínuo / em linhas emaranhadas de / mapas desfeitos" (Mapa para Murilo Mendes, p. 97).
É difícil interromper a leitura do livro que guarda uma estrutura encadeada em cinco partes, até chegar ao poema final: Também estivemos em Pompeia (p. 115). Uma poesia rica de imagens e metáforas que nos surpreende e ensina, como o pulo de um gato quântico e bailarino.
E pelos ares lá vai o gato
E pelos ares lá vai o gato
Sobrevoa os cumes do meu delírio
Unhas em riste
Atravessa a fímbria
da noite antiga
que adorna minha tristeza
(Que nome de vento
batizou seus ossos?)
E pousa
Sinuoso paraquedista
arrepiada envergadura de coluna inflada
Pousa o silêncio
no telhado
que mesmo partido
jamais se moverá
sob a eletricidade de suas patas
(Que o gato aterrisse
também
suave assim no meu peito
Que o veludo do gato vede
esta assassina sinfonia de colisões)
E quando eu estiver caindo
que o gato
(quântico bailarino)
me ensine
a insultar o abismo
com um passo de dança.
Em Tennessine (p. 33), a poeta nos alerta como somos brilhantes "na tarefa de empilhar rancores", assim como "na organização das decepções / e na contabilidade diária das perdas" quando, na verdade, deveríamos saber "que luz é só uma pausa / Porque o fim / é logo ali". Lindo não é mesmo? Uma mensagem importante para tempos sombrios, nos quais só a luz da poesia, mesmo que momentânea, pode nos salvar. Simone Teodoro escreveu um livro muito oportuno, forte e engajado com a liberdade e a felicidade.
Sobre a autora: Simone Teodoro nasceu em Belo Horizonte em 1981. Define-se como uma leitora compulsiva de poesia, mestra e doutoranda em Literatura Brasileira pela UFMG. Há textos seus publicados em algumas revistas literárias eletrônicas brasileiras, como Mallarmagens, Germina e na portuguesa Incomunidade. Publicou também no Suplemento Literário de Minas Gerais e no jornal O Relevo. Participou da exposição Poesia agora, que esteve em cartaz no Museu da Língua Portuguesa em 2015. Mantém o blog Cálida Poesia cobrindo a sua produção poética no período de 2006 a 2016. É autora dos livros de poemas Distraídas Astronautas (Patuá, 2014) e Movimento em Falso (Patuá, 2016). Simone é poeta, guarda pássaros na garganta e alguma pólvora dentro dos ossos.
Lendo os poemas de Simone, escuto os ecos dos gritos de outras mulheres no passado que também souberam transformar a dor em poesia, mulheres como Sylvia Plath, Elizabeth Bishop, Ana Cristina Cesar e Hilda Hilst, assim como a influência da tradição poética nas raízes do simbolismo francês nos versos de mestres como Rimbaud, Verlaine e Baudelaire. Não é pouca coisa. Adriane Garcia lembra, na apresentação do livro, como escrever sobre a dor pode significar também uma forma de libertação, que assim seja então.
Não chore
pequena Loba
pelos teus pássaros apodrecidos
Nem enlouqueça quando os vermes
violarem o azul de teu verão mais bonito
É da natureza dos muros
existirem para atrair o musgo
assim como o sentido da chuva
é engendrar a lama
para decompor a vida
Apenas golpeie
com punhos
ou rosas
golpeie
Não se esquive de causar assombro
como um trecho de sinfonia
E acima de tudo
goze
pequena Lobo
como se
inteiro
um sol ardesse
em teu
útero
Não se espante com as múltiplas referências que podem abranger desde uma conversa com Drummond, intercalada com uma canção de Morrissey no mesmo poema (Cheiro forte de ferro e náusea, p. 59), até uma homenagem ao grande prosador surrealista (e tão esquecido) Murilo Mendes: "Nunca soube andar só, Murilo / Minha existência tem sido / um tropeçar contínuo / em linhas emaranhadas de / mapas desfeitos" (Mapa para Murilo Mendes, p. 97).
É difícil interromper a leitura do livro que guarda uma estrutura encadeada em cinco partes, até chegar ao poema final: Também estivemos em Pompeia (p. 115). Uma poesia rica de imagens e metáforas que nos surpreende e ensina, como o pulo de um gato quântico e bailarino.
E pelos ares lá vai o gato
E pelos ares lá vai o gato
Sobrevoa os cumes do meu delírio
Unhas em riste
Atravessa a fímbria
da noite antiga
que adorna minha tristeza
(Que nome de vento
batizou seus ossos?)
E pousa
Sinuoso paraquedista
arrepiada envergadura de coluna inflada
Pousa o silêncio
no telhado
que mesmo partido
jamais se moverá
sob a eletricidade de suas patas
(Que o gato aterrisse
também
suave assim no meu peito
Que o veludo do gato vede
esta assassina sinfonia de colisões)
E quando eu estiver caindo
que o gato
(quântico bailarino)
me ensine
a insultar o abismo
com um passo de dança.
Em Tennessine (p. 33), a poeta nos alerta como somos brilhantes "na tarefa de empilhar rancores", assim como "na organização das decepções / e na contabilidade diária das perdas" quando, na verdade, deveríamos saber "que luz é só uma pausa / Porque o fim / é logo ali". Lindo não é mesmo? Uma mensagem importante para tempos sombrios, nos quais só a luz da poesia, mesmo que momentânea, pode nos salvar. Simone Teodoro escreveu um livro muito oportuno, forte e engajado com a liberdade e a felicidade.
Sobre a autora: Simone Teodoro nasceu em Belo Horizonte em 1981. Define-se como uma leitora compulsiva de poesia, mestra e doutoranda em Literatura Brasileira pela UFMG. Há textos seus publicados em algumas revistas literárias eletrônicas brasileiras, como Mallarmagens, Germina e na portuguesa Incomunidade. Publicou também no Suplemento Literário de Minas Gerais e no jornal O Relevo. Participou da exposição Poesia agora, que esteve em cartaz no Museu da Língua Portuguesa em 2015. Mantém o blog Cálida Poesia cobrindo a sua produção poética no período de 2006 a 2016. É autora dos livros de poemas Distraídas Astronautas (Patuá, 2014) e Movimento em Falso (Patuá, 2016). Simone é poeta, guarda pássaros na garganta e alguma pólvora dentro dos ossos.
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