Margarida Patriota - Cárcere privado
Margarida Patriota - Cárcere privado - Editora 7Letras - 180 Páginas - Coordenação Editorial de Isadora Travassos e Jorge Viveiros de Castro - Capa: Alice Garambone - Lançamento: julho de 2019.
A cidade de Brasília é o cenário deste romance policial, no qual o crime e a autora – no caso, a narradora-protagonista – são revelados logo no parágrafo de abertura, mas as motivações serão levadas ao conhecimento do leitor muito lentamente, ao longo de todo o livro. É difícil acreditar na veracidade dos fatos e no caráter de uma narradora nada confiável, que submete uma outra mulher a um regime de cárcere privado com requintes de crueldade. Este sentimento de incerteza é conduzido com muita habilidade pela autora, que oculta e revela ao mesmo tempo, em uma abordagem psicológica.
A partir de um núcleo de moradores de um prédio de luxo na Asa Sul do Plano Piloto, a autora explora os contrastes entre uma classe de funcionários privilegiados do Governo e outros, nada privilegiados, que lutam como podem pela sobrevivência. A protagonista, por exemplo, é uma ex-alta funcionária que se desentendeu com a nossa última presidenta e trabalha como tradutora independente. Ela decide acertar as contas com Mara Dália, uma personagem misteriosa que não é apresentada formalmente pela autora, durante um final de semana em que estão sozinhas no apartamento. Muitas interrupções inesperadas dos vizinhos, algumas bem divertidas, adiam o desfecho desse suspense que desafia o leitor a cada página.
"Lacei-a com fita adesiva de empacotamento, até gastar o rolo todo. A manobra desagradável resultou expedita, pelo menos. Gastei para embrulhá-la tempo inferior ao previsto. Tampouco cuidei de caprichar no embrulho. Quis apenas neutralizá-la. Não despachá-la pelo correio a nenhum endereço com CEP e tudo. [...] Tranco a porta do escritório por precaução elementar, ainda que desnecessária. Dália, a sós, não tem como se evadir. Além dela, não há ninguém no apartamento, senão eu. De maneira que só eu posso libertá-la, no momento. No banheiro, diante do espelho de parede, em cima da pia, ajeito o cabelo com escovadas rápidas, retoco com os dedos os fios rebeldes. Na prateleira do armário que integra a suíte, pego a bolsa do dia a dia e parto para o elevador social." (p. 7)Outro aspecto peculiar da obra é a forma como se vale de personagens representativos do cotidiano de uma cidade que não se enquadra com facilidade em definições de guias turísticos. Nas palavras de Clarice Lispector, Brasília é o local onde dois arquitetos "não pensaram em construir beleza, seria fácil: eles ergueram o espanto inexplicado" ou ainda: "uma prisão ao ar livre" onde "a alma não faz sombra no chão" (citações de "Visão do Esplendor", 1975). Exageros à parte, a nossa capital que é classificada como Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco, já aprendeu a conviver com o seu destino de "cidade planejada" e a responsabilidade de ser o centro do poder político do país.
A partir de um núcleo de moradores de um prédio de luxo na Asa Sul do Plano Piloto, a autora explora os contrastes entre uma classe de funcionários privilegiados do Governo e outros, nada privilegiados, que lutam como podem pela sobrevivência. A protagonista, por exemplo, é uma ex-alta funcionária que se desentendeu com a nossa última presidenta e trabalha como tradutora independente. Ela decide acertar as contas com Mara Dália, uma personagem misteriosa que não é apresentada formalmente pela autora, durante um final de semana em que estão sozinhas no apartamento. Muitas interrupções inesperadas dos vizinhos, algumas bem divertidas, adiam o desfecho desse suspense que desafia o leitor a cada página.
"Mara Dália, como previsto, permanece deitada no chão de tacos. Jaz na forma em que a deixei, quando saí para levar Jonas ao aeroporto. Tentativas de mexer a boca, o queixo, os maxilares não fizeram a mordaça ceder. O corpo não afrouxou a estreita armadura de fita colante em que a encerrei. Os punhos seguem atados sem espaço para manobra, o mesmo ocorrendo com os tornozelos. As pernas, o tronco e os braços continuam encolhidos em posição fetal. Dália não demonstra perceber que entrei no quarto e a inspeciono. Ou banca a morta para me assustar. Acomodo-me no pufe bojudo e mole que posicionei a um passo dela. E espero. Espero, sem pressa, que o cheiro do café que beberico lhe açule o olfato e a acorde." (p. 14)Sobre a autora: Margarida Patriota é autora, entre outros, dos juvenis Uma voz do outro mundo (Ed. Dimensão), agraciado com o Premio João de Barro, e Enquanto aurora (7Letras), Prêmio UBE/RJ. Seus livros mais recentes são a novela U´Yara, rainha amazona (Saraiva); o romance A lenda de João, o assinalado (Topbooks), inspirado no poeta Cruz e Sousa; a tradução para o português do romance de Henry James, A herdeira (7Letras); e o volume de poemas Laminário (7Letras). Há 21 anos produz e apresenta o programa Autores e Livros na Rádio Senado (Ed. Senado Federal). Um livro com uma reunião de suas melhores entrevistas foi lançado em 2015, Autores e Livros na Rádio Senado (Edições do Senado Federal).
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