Franz Kafka - O Processo
Franz Kafka - O Processo - Editora Companhia das Letras - 332 páginas - Tradução e pósfacio de Modesto Carone - Lançamento 1998.
Imagino que existam muito poucas homenagens mais relevantes para um autor do que ter o próprio nome transformado em adjetivo pela importância e característica de sua obra, mesmo que este adjetivo tenha sido imortalizado como designação para situações irreais, desvios mentais ou simplesmente pesadelos. Foi assim que o escritor tcheco Franz Kafka (1883-1924), com obras como "A Metamorfose" (1912) e "O Processo" (1914), originou a expressão "kafkiana" que pode ser utilizada para resumir situações como a que vivemos hoje no Rio de Janeiro pela falta de efetividade das ações políticas governamentais e que ainda, devido à corrupção ou burocracia, não conseguem evitar os problemas urbanos com a educação, segurança e transporte.
A prosa de Kafka é surpreendentemente leve e direta, na verdade, inversamente proporcional à profundidade psicológica de seus romances, sendo que a abertura do Processo é o maior exemplo desta simplicidade narrativa, atraindo o leitor para as espirais sem fim do seu enredo: "Alguém certamente havia caluniado Josef K. pois uma manhã ele foi detido sem ter feito mal algum". Assim tem início o processo de Josef K., ou simplesmente K., procurador de um banco detido sem nenhum motivo especial e julgado por um tribunal que, "atraído pela culpa" dos pretensos réus, desenvolve incompreensíveis inquéritos. Aos poucos, somos envolvidos pela atmosfera claustrofóbica do romance e percebemos, juntamente com K., que a absolvição é uma esperança muito remota. As semelhanças com Raskólnikov, personagem de Crime e Castigo de Dostoiévski, são muitas e tendo como ligação o sentimento de culpa, mas Kafka tem um elemento de humor (apesar de tudo), sempre presente no seu texto, que é inexistente no mestre russo.
Os textos críticos sobre Kafka ainda estão longe de serem conclusivos para desvendar as verdadeiras intenções deste romance. Seja como alegoria da sua própria vida ou como crítica à inexistência do estado democrático de direito, a verdade é que o autor, que foi influenciado pelas culturas judaica, tcheca e alemã, não viveu para ver a brutalidade dos eventos da Segunda Grande Guerra e de como a sua "ficção" acabou, de certa forma, profetizando o absurdo das detenções sem motivo, perseguições e extermínio em massa do regime nazista. Outra característica interessante sobre este romance é que, afinal, trata-se de uma obra inacabada e que possivelmente não seria publicado por Kafka que entregou os originais para seu amigo Max Brod com a condição de que ele destruísse os manuscritos após sua morte, fato que acabou não ocorrendo já que Brod publicou o livro em 1925.
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Comentários
É dos meus autores preferidos. Dos que mais me marcou.
Já agora: se não conheces: do mesmo período e do mesmo local (conheciam-se) recomendo " o valente soldado Cheik" de Jaroslval Hasek. Uma obra prima da literatura e com um humor inimitável.
Do kafka não consigo dizer muito para além de "um génio". A minha queda é para o "metamorfose"...
A minha questão é provocatória.
Na verdade não sei se gostaria de saber-me 'desautorizada' depois da minha morte, ainda que o pedido pudesse ser injusto.
Acredito que ganhamos nós, definitivamente ganhamos nós.
Contudo, a questão permanece: até que ponto é ético? :)
Recentemente foi publicado "O Original de Laura", trinta e dois anos após a morte de Vladimir Nabokov, autor de Lolita. Ele também teria pedido à mulher que queimasse os originais.
De qualquer forma, o caso de Kafka me parece bem diferente do lançamento recente de Nabokov que parece ter sido ditado unicamente por interesses de ganho financeiro.
Meus olhos pelam esse livro em dois segundos...
(Para Ligia Guedes)
interessa no mundo?
da valia dos escombros
Senão em risos opacos, vozes disjuntas
Interessa qualquer coisa transmutada
Dito nomes, feito símbolos
Interessa qualquer coisa assim
Feito aceno breve, sorrateiro
Reluzente de esgar
De bruma partida nos olhos contritos -
debruados numa valsa, numa dúvida
vago esgar de peito caindo, caindo
Noite ida, noite ida
Dei prá acalentar a escuridão
como se fosse um pedaço de beijo
Ou um tombo de mariposa no abismo
Na vidraça
Na vidraça um pardal
Enxangue
retalhada voz sentida
aquietada, estática
era para ser uma janela
No degrau do quintal
quando amanhece e o dia
se faz claro sobre as asas deixadas
vazias
perdidas
como os acenos perdidos - e onde as asas eram quase asas de voar .
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Querido Kovacs, obrigado pela presença.
Kovacs, obrigada por tudo.
Para lembrar a origem/inspiração do "cemitério de pássaros" ver a postagem:
http://mundodek.blogspot.com/2010/09/20-momentos-de-nelson-rodrigues.html
Abraços e beijos.
P.S.: Não sei responder lá no blog.