Moacyr Scliar (1937-2011)
"Noel Nutels. Lembro como se fosse hoje o primeiro dia em que o vi, menino ainda. Foi no navio que nos trouxe para o Brasil, em 1921. Era um navio alemão, mas não tinha nome alemão, chamava-se 'Madeira', em homenagem à ilha portuguesa. Simbólica coincidência: de certa forma refazíamos a viagem dos navegadores portugueses, Cabral e os outros. Como eles, atravessaríamos o oceano, rumo ao Brasil; não numa precária caravela, mas também não num luxuoso transatlântico - longe disso. O senhor precisava ter visto o 'Madeira', doutor. A rigor, nem navio de passageiros era; tratava-se de um cargueiro adaptado para o transporte de emigrantes. No porão tinham instalado beliches, oitenta beliches triplos, quase nenhum espaço entre um e outro. Latrinas, quatro; pias, quatro, nem sempre com água. Era impossível ficar naquele porão, passávamos a noite lá, mas mal amanhecia subíamos para respirar um pouco de ar fresco. O senhor conhece aquele quadro do Lasar Segall, 'Navio de Imigrantes'? Aquele quadro que mostra pessoas amontoadas num convés, pessoas de olhar triste? Era exatamente aquilo. Nós estávamos emigrando, doutor. Melhor dito: estávamos fugindo. Fugindo da Rússia."
A Majestade do Xingu - Moacyr Scliar
Comentários
Moacyr Scliar, Discutindo Literatura nº 13.
Que grande pena a perdida deste enorme escritor e ser humano!
e tbem gostei da frase que colocou de Millor!
um gde abraçO
Com a morte do Moacyr Scliar, literatura brasileira perde o que ele ainda poderia produzir. O consolo é que escreveu setenta livros, mas ainda tinha muito para escrever.
Também perdemos o ser humano que era muito diferente de um grande número de escritores, por sua simplicidade, atenção e bondade. Parecia ser deprovido de vaidade, o que é raro no ofício da literatura.
Aqui em Porto Alegre, em especial no bairro Bom Fim, onde nasceu e morou por muitos anos (também resido nesse bairro), vamos sentir a falta da presença física do Scliar.
Também na Feira do Livro, onde sempre o encontrávamos, vamos sentir o peso de sua ausência.
Nessa feira, que se realiza anualmente no mês de novembro, na qual já foi seu Patrono, era comum encontrá-lo falando com pessoas que o conheciam, principalmente com crianças, sempre procurando transmitir a idéia de que tudo passa pelos livros.
Na próxima Feira do Livro sei que vou ouvir a Taís, minha mulher, dizer que não mais vamos ver o Scliar. Quantas vezes ouvi ela chamar minha atenção quando o via entre os livros - Pedro, olha o Scliar ali - chamava ela minha atenção. Aqui, muitos devem estar sentindo a mesma falta que Taís e eu sentimos.
É isso, caro Covacs.
Um abraço,
Pedro.
Andava por várias cidades do Rio Grande do Sul para conversar com as crianças de 1º grau. Viajava por todo o país para levar a literatura a todos os cantos possíveis e falava com naturalidade. Realmente perdemos um dos nossos mais queridos escritores que, de suas caminhadas pelo bairro nasciam crônicas e contos excelentes, o nosso cotidiano que contava com graça e perfeição. Realmente ficará como imortal.
Beijos
Tais Luso
* O Pedro escreveu teu nome, por descuido, com 'C' ao invés de 'K'.
O Luiz Schwarcz escreveu um texto lindo sobre o Scliar no blog da editora Companhia das Letras, recomendo uma visita por lá, caso já não tenham lido:
http://www.blogdacompanhia.com.br/2011/02/o-final-da-historia/comment-page-2/#comments
Enfim, fico triste de vocês terem perdido o querido vizinho de bairro. Foi uma grande honra ter convivido com este mestre.
Obrigado pela gentileza dos comentários e parabéns pelo belo trabalho que vocês desenvolvem nos respectivos blogs, nunca é demais dizer.