Murilo Velludo Ferreira - Teu coração é uma dor sozinha

Poesia brasileira contemporânea
Murilo Velludo Ferreira - Teu coração é uma dor sozinha - Editora Mondru - 96 Páginas - Capa e projeto gráfico: Jeferson Barbosa - Ilustrações: Murilo Velludo Ferreira - Lançamento: 2023.

O livro de poemas de Murilo Velludo Ferreira, financiado por meio do edital 11/2022 – I Semana Municipal de Poesia “José Roberto Telarolli – O Poeta da Vila” – da Secretaria Municipal de Cultura da Prefeitura de Araraquara, foi publicado em uma edição caprichada da Editora Mondru, contando com acabamento gráfico diferenciado e ilustrações do próprio autor. O excelente título, "Teu coração é uma dor sozinha", já nos coloca no contexto, da obra, entre a cidade e o mar a poesia se inspira na solidão, como bem expresso nos versos de "Residência Declarada" (p.17): "Nascer é isso: / Estamos sós / E isso nos acompanha por toda a vida”.

De fato, apesar da convivência virtual e presencial nos grandes centros urbanos, nos sentimos cada vez mais solitários e levamos a vida no modo automático, como nos alerta o poema "Diástole" (p.15): "O coração, músculo involuntário / Bate à força própria / Sua vida independe de sentido" ou ainda na abordagem existencialista de "Fresta" (p. 37): "Existir é sempre algo que se dá por uma fresta / Todo o resto / permanece inatingível" Tudo parece mesmo carecer de objetivo e a citação de "Cajuína" ao final do livro – letra que é um verdadeiro poema metrificado de Caetano Veloso –, nos faz pensar e resume bem a questão: "Existirmos: a que será que se destina?".

DIÁSTOLE

Tenho vivido de eternidades mútuas
Faço disso a diástole do que me cabe

Sob a luz do abajur
Reconheço cada trinca no teto do quarto
Cada desnivelamento do piso
Aqui
Mais perto de onde resido
Permaneço residual
Uma condição de quem aguarda
De quem espera que as luzes se apaguem
Que o resto se esgote
Antes

O coração, músculo involuntário
Bate à força própria
Sua vida independe de sentido

RESIDÊNCIA DECLARADA

Nascer e morrer no mesmo lugar
Não mudar nem alterar os endereços

Nascer é isso:
Estamos sós
E isso nos acompanha por toda a vida

Encontro-me apenas em mim mesmo
Cíclico e invariável
Encerrado nos limites dessa rua
Sem saída

Os outros que foram
Há muito já estão postos
E seguem acumulando poeira
Na idiossincrasia do que os mantém
Afastados

Lúcidos
Com endereço fixo e declarado

TODOS OS CORPOS QUE ORBITAM O SOL

Todos os corpos que orbitam o sol
De uma forma ou outra
Se chocam no espaço
Sem nada que os impeça de negar suas elipses

Todos os corpos que orbitam o sol
Circundam também o meu rosto
Exercem sobre mim vontades invisíveis
E amanhã não existirá mais nada
Nada que não seja esse cansaço
Arrastado

Todos os corpos que orbitam o sol
Unidos pelas mesmas vertigens
Ou por modulações nas luzes
Equilibrando o universo
Nas pontas dos dedos

Todos os corpos que orbitam o sol
Alheios ao seu calor
Como a criança que fui
Na esquina
Soprando segredos
Passam desapercebidos
E partilham seu ser sozinho

Todos os corpos que orbitam o sol
Recíprocos
E calados na chuva
Sem saber
Que amanhã não existirá mais nada

Para podermos acordar
Mais uma vez atrasados
E com pressa
E sem fome
Do repentino
De nada 

Todos os corpos que orbitam o sol
Ao acordarem as coisas
Altamente empenhados em nascerem o dia
Que quase sempre acaba atrasado
Cansado e arrastado

Todos os corpos que orbitam o sol
Circundam também o meu rosto
Sem se fazerem percebidos 
Sem rastro de estrondos ou ruídos
.
.

Tudo isso se rende a uma única verdade:
Eu não sinto o sol queimar sob a minha pele

Poesia brasileira contemporânea
Sobre o autor: Nascido e criado em Araraquara, no interior de São Paulo, Murilo Velludo Ferreira demonstrou interesse pela arte desde a infância. Com o tempo, passou a estabelecer diálogos entre a poesia e outras formas de conhecimento, como as ciências sociais e a filosofia. É formado em Direito. Pela Editora Mondru, também publicou seu primeiro livro de poesia – "Saudade Como Vocativo" (2022) – com lançamento na Casa Gueto (Flip 2022). Aos 27 anos, publicou o segundo, "Teu Coração é uma dor sozinha".

Onde encontrar o livro: Clique aqui para comprar Teu coração é uma dor sozinha de Murilo Velludo Ferreira

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