Le Clézio - A Quarentena
Le Clézio - A Quarentena - Editora Companhia das Letras - 363 páginas - Tradução Maria Lúcia Machado - Publicação 2008 (lançamento original 1995 - Éditions Gallimard).
O francês Jean-Marie Gustave Le Clézio foi definido pela Academia sueca, ao receber o Prêmio Nobel de Literatura de 2008, como: "um escritor da ruptura, da aventura poética e do êxtase sensual, explorador de uma humanidade além da civilização dominante", todas estas características estão presentes neste romance inspirado pela história da própria família do autor que, durante a colonização francesa, no final do século XVIII, emigrou para a ilha Maurício no Oceano Índico. O livro tem como base um fato verídico ocorrido com o avô de Le Clézio quando, ao retornar para ilha Maurício, após uma temporada na França, foi isolado, juntamente com os demais passageiros do navio, devido a uma epidemia a bordo e colocado em quarentena numa ilhota próxima ao destino. Este parente de Le Clézio acabou abandonando a colônia e retornando definitivamente para a metrópole após este episódio.
Le Clézio soube transformar em ficção esta memória familiar ao narrar a epopeia dos irmãos Jacques e Léon Archimbau que em 1891, após uma epidemia de varíola a bordo do navio em que retornavam da Europa para ilha Maurício em busca de suas raízes familiares, juntamente com refugiados indianos, recrutados para trabalhar nas fazendas de cana de açúcar, são confinados em uma das pequenas ilhas vulcânicas próximas à Maurício. A necessidade de sobrevivência de todo o grupo, praticamente abandonado à própria sorte pelas autoridades, sem medicamentos apropriados e alimentos, torna a vida na ilha insuportável. Neste ambiente hostil e cercado pela morte, Léon se apaixona pela bela nativa Suryavati (força do sol), filha de Ananta uma inglesa sobrevivente da rebelião contra a dominação inglesa na Índia e do massacre de Cawnpore (hoje conhecida como Kanpur).
Intercalada com a narrativa principal, o autor conta a história secundária da fuga de Ananta que, ainda criança, é recolhida do peito ensanguentado da aia morta em Cawnpore. A longa jornada dos refugiados vindos da Índia, principalmente mulheres e crianças, todos sobreviventes da rebelião contra o colonizador britânico e o seu sofrimento para chegar ao destino como escravos na ilha Maurício é um dos pontos fortes do livro, como na seguinte passagem: "Ela tomou a rota do sul, rumo ao rio Yamuna, através dos campos devastados. No Oudh, as cidades queimavam, Lucknow, Cawnpore, Fatehpur. A fumaça dos incêndios cobria o céu como se fosse sempre crepúsculo. O sol nadava atrás do véu cinza-rosado. Nas estradas, havia bandos de fugitivos, velhos, mulheres, crianças, carregando fardos de roupa, provisões. Os homens haviam desaparecido. Por toda parte, o odor de sangue, da morte. Os poços estavam envenenados pelos cadáveres que haviam sido lançados neles. E a fome roía o ventre, a fome feria a terra, secava as fontes".
A força da natureza é uma marca presente todo o tempo no texto e os personagens parecem interagir com seus sentidos influenciados pelo isolamento e também pelo ambiente da ilha como neste trecho que mostra Léon e Suryavati em um "êxtase sensual" como definiu a apresentação do prêmio Nobel: "Surya lançou um grito, senti seu corpo tremer como se uma mesma vaga passasse de mim para ela, senti o fluxo de minha semente que subia, que jorrava do mundo, das rochas negras do vulcão, dos recifes onde quebra o mar. Tive medo, medo do que acontecia, medo dessa força irresistível, olhei o rosto de Surya perturbado por um esgar, ela parecia ter dor, eu ouvia sua respiração arranhada, sentia o suor que corria em seus ombros, em suas costas, em seus seios, que colava seus cabelos nas têmporas. Meus lábios procuraram a boca de Surya. Eu segurava sua cintura maleável, ela ria. Juntos caíamos novamente na água, eu sentia suas pernas enrodilhar-se nas minhas, seus braços que me estreitavam. Sufocávamos. Reerguíamo-nos, o tempo de recuperar nosso fôlego. Voltamos a ser crianças. Nascidos de novo, na água corrente da laguna, sem passado e sem futuro".
Intercalada com a narrativa principal, o autor conta a história secundária da fuga de Ananta que, ainda criança, é recolhida do peito ensanguentado da aia morta em Cawnpore. A longa jornada dos refugiados vindos da Índia, principalmente mulheres e crianças, todos sobreviventes da rebelião contra o colonizador britânico e o seu sofrimento para chegar ao destino como escravos na ilha Maurício é um dos pontos fortes do livro, como na seguinte passagem: "Ela tomou a rota do sul, rumo ao rio Yamuna, através dos campos devastados. No Oudh, as cidades queimavam, Lucknow, Cawnpore, Fatehpur. A fumaça dos incêndios cobria o céu como se fosse sempre crepúsculo. O sol nadava atrás do véu cinza-rosado. Nas estradas, havia bandos de fugitivos, velhos, mulheres, crianças, carregando fardos de roupa, provisões. Os homens haviam desaparecido. Por toda parte, o odor de sangue, da morte. Os poços estavam envenenados pelos cadáveres que haviam sido lançados neles. E a fome roía o ventre, a fome feria a terra, secava as fontes".
A força da natureza é uma marca presente todo o tempo no texto e os personagens parecem interagir com seus sentidos influenciados pelo isolamento e também pelo ambiente da ilha como neste trecho que mostra Léon e Suryavati em um "êxtase sensual" como definiu a apresentação do prêmio Nobel: "Surya lançou um grito, senti seu corpo tremer como se uma mesma vaga passasse de mim para ela, senti o fluxo de minha semente que subia, que jorrava do mundo, das rochas negras do vulcão, dos recifes onde quebra o mar. Tive medo, medo do que acontecia, medo dessa força irresistível, olhei o rosto de Surya perturbado por um esgar, ela parecia ter dor, eu ouvia sua respiração arranhada, sentia o suor que corria em seus ombros, em suas costas, em seus seios, que colava seus cabelos nas têmporas. Meus lábios procuraram a boca de Surya. Eu segurava sua cintura maleável, ela ria. Juntos caíamos novamente na água, eu sentia suas pernas enrodilhar-se nas minhas, seus braços que me estreitavam. Sufocávamos. Reerguíamo-nos, o tempo de recuperar nosso fôlego. Voltamos a ser crianças. Nascidos de novo, na água corrente da laguna, sem passado e sem futuro".
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Comentários
Beijos, k!
Tuas resenhas são ótimas, deve ser um livro bastante interessante.
abraço
Gi
Abraços.
Ótima lembrança, como sempre. Abraços.
Abraços,
Eliana
Parabéns pelo lançamento de Dança Ritual Urbana: http://djabalmaat.blogspot.com/
e meu querido amigo obrigada pelos comentarios,um abraço,