Fernando Pessoa - Poesia completa de Ricardo Reis
Fernando Pessoa (1888-1935) criou heterônimos com diferentes personalidades imaginárias e estilos, sendo alguns dos mais famosos: Alberto Caeiro, Ricardo Reis, Álvaro de Campos e Bernardo Soares. As odes e poemas de Ricardo Reis guardam alguma semelhança com a poesia de Alberto Caeiro, mas podemos constatar que os questionamentos filosóficos do primeiro estão mais relacionados à brevidade da existência e à necessidade de viver plenamente cada momento: "Nada fica de nada. Nada somos. / Um pouco ao sol e ao ar nos atrasamos / Da irrespirável treva que nos pese / Da úmida terra imposta, / Cadáveres adiados que procriam. / Leis feitas, státuas altas, odes findas – / Tudo tem cova sua. Se nós, carnes / A que um íntimo sol dá sangue, temos / Poente, por que não elas? / Somos contos contando contos, nada." (28-9-1932)
Nesta edição foram reunidas as odes publicadas em vida por Fernando Pessoa e por ele atribuídas a Ricardo Reis, assim como todas as outras odes e poemas atribuídos a esse heterônimo, disponíveis no espólio da Biblioteca Nacional de Lisboa e, na sua quase totalidade, publicados postumamente. Enriquecem este lançamento o texto de Manuela Parreira da Silva, especialista no estudo e recuperação do espólio de Fernando Pessoa, assim como um posfácio inédito, "Tenho mais almas que uma", escrito pelo poeta Paulo Henriques Britto que resume uma verdade inquestionável: "Se a obra pessoana se resumisse aos duzentos e tantos poemas e fragmentos que compõem o corpus de Ricardo Reis – o menos lido e estudado dos quatro principais poetas da constelação Pessoa –, ela já mereceria um lugar de destaque na literatura lusófona do século XX."
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(3-11-1923)
Tão cedo passa tudo quanto passa!
Morre tão jovem ante os deuses quanto
Morre! tudo é tão pouco!
Nada se sabe, tudo se imagina.
Circunda-te de rosas, ama, bebe
E cala. O mais é nada.
99
(26-4-1928)
108
(26-5-1930)
111
(18-6-1930)
155
(13-11-1935)
Vivem em nós inúmeros;
Se penso ou sinto, ignoro
Quem é que pensa ou sente.
Sou somente o lugar
Onde se sente ou pensa.
Tenho mais almas que uma.
Há mais eus do que eu mesmo.
Existo todavia
Indiferente a todos.
Faço-os calar: eu falo.
Os impulsos cruzados
Do que sinto ou não sinto
Disputam em quem sou.
Ignoro-os. Nada ditam
A quem me sei: eu escrevo.
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