Marcos Alexandre Faber - Por dentro de Rita Hayworth
O mais recente lançamento do escritor, professor, poeta e músico pernambucano Marcos Alexandre Faber é uma novela narrada em primeira pessoa por Rita Hayworth (1918-1987), mas não uma personagem representando a glamourosa atriz norte-americana em carne e osso e sim uma imagem dela em um pôster na parede de uma cela. Em uma criativa construção literária de intertextualidade, esta cela pertence a Andy Dufresne, na prisão de Shawshank, retratada no filme "The Shawshank Redemption" estrelado por Tim Robbins e Morgan Freeman e lançado no Brasil como “Um sonho de liberdade” em 1994, livremente inspirado em "Rita Hayworth and Shawshank Redemption", uma novela escrita por Stephen King e publicada em 1982.
Na trama original, o banqueiro Andy Dufresne é condenado a duas prisões perpétuas na Penitenciária Estadual de Shawshank pelo suposto assassinato de sua esposa e do amante dela. Lá, ele fica amigo de outro detento, Ellis Boyd "Red" Redding, que promove contrabandos na prisão e consegue um pequeno martelo de geólogo e depois um pôster de Rita Hayworth a pedido de Andy, instrumentos que serão utilizados no seu plano de fuga, após mais de vinte anos encarcerado injustamente. Na obra de Marcos, todo o protagonismo vai para a imagem de Rita Rayworth que, apesar de também aprisionada na sua condição de papel e tinta, acaba se apaixonando pela personalidade franca e gentil de Andy Dufresne, logo percebendo a sua inocência.
"Em 1949, quando cheguei a Shawshank, eu pensava que já tinha visto tudo na vida e na arte. Três casamentos, três dezenas de filmes, uma mudança de nome e uma transformação radical que me fizeram um mito. / Lembro bem quando aportei. Eu vim como uma encomenda, por 2,50 dólares mais comissão, e desde o início foi diferente de tudo. Ao sair do tubo com meus 1,30 metros, me senti como um gênio libertado da lâmpada para atender aos pedidos do seu dono. E tudo que eu queria era satisfazer logo qualquer capricho ou fetiche para ser esquecida. Nesta hora pode começar um longo processo de violência e abusos. Não foi o caso. / Ao me tirar do casulo, Andy Dufresne, prisioneiro 81433, não me olhou nos olhos. Na verdade, ele olhou através de mim. Parecia longe, distante, como quem tem um plano inacessível. / Foi a sua mão delicada que, ao me pôr na parede, me disse a primeira coisa sobre ele. Uma mulher sempre olha nas mãos de um homem e as dele eram macias com dedos longos de pianista e unhas aparadas, diferente das encaliçadas dos mecânicos e dos lavradores de batata e cebola do Oregon, presenças mais vulgares na penitenciária e que eu conhecia tão bem." (pp. 19-20)
O que mais surpreende na estratégia ficcional de Marcos, além da convincente narrativa na voz feminina, já bem-sucedida em sua novela anterior, "A leitora de poesia", foi a humanização da imagem de Rita Hayworth, transformada de objeto sexual em um ser humano completo, certamente um desejo da mulher e mito Rita Hayworth – nascida Margarita Carmen Cansino – que talvez trocasse de bom grado os tapetes vermelhos e flashes dos paparazzi pela chance de um único e verdadeiro amor: "Eu não sabia que existiam homens desta espécie. Por que eu perdi tanto tempo procurando em lugares errados? Estes seres não fazem cinema, nem frequentam as festas da Broadway. A indústria é um lugar de perversão, não cabem anjos como o Andy."
"Minha Virgem do Pilar, padroeira de Saragoça e de Espanha me ajude. Proteja o meu Andy. A Senhora que tem o poder da bilocação me leve ao Andy. Não o deixe só. Tu que apareceste em companhia dos anjos para Tiago quando teve dificuldade em seus sacrifícios missionários às margens do Ebro não o abandones enquanto estiver longe de mim. / Tu bem sabes que eu não tenho como pagar uma promessa, não tenho como ir à Basílica de joelhos, não posso jejuar, mas posso pedir de coração. Transporta pela mão dos anjos o Andy de volta para mim. / Não por acaso que hoje é dia 12 de outubro, as Fiestas del Pilar. Tu que tens o dom místico, me faz este milagre. Em troca te faço uma promessa, um sacrifício: Eu que havia pensado em rogar-te para ser gente, para que me transformasse em uma pessoa de carne e osso, para que eu pudesse tê-lo em meu corpo, de tudo abdico: Eu nada quero e tudo suporto, eu me conformo e me resigno com a minha condição de papel e tinta, mas proteja o Andy e o traga para mim. Deixe-me vê-lo ao menos uma vez mais. / Protege, um por um, cada fio de seus cabelos, cada um dos seus dentes e dedos. Coloca o teu manto e não deixa que nenhuma faca o perfure, que nenhuma bala o encontre. Mas sobretudo, que ele sinta vontade de voltar. Que ele não desista de viver dentro daquela cela escura, por onde não entra a luz, onde os demônios se escondem. Eu conheço por dentro a alma nobre daquele homem. Não seria justo um inocente sucumbir diante dos malvados, dos perversos do mundo. / Se eu não acreditasse em milagres, eu não teria como explicar as lágrimas que me caíram do rosto." (pp. 52-3)
Onde encontrar o livro: Clique aqui para comprar Por dentro de Rita Hayworth de Marcos Alexandre Faber
Comentários