Isabel Allende - Filha da fortuna

Literatura língua espanhola
Isabel Allende - Filha da fortuna - Editora Bertrand - 378 Páginas - Capa: Angelo Allevato Bottino - Tradução de Mario Pontes - Lançamento: 10/09/2018.

Temos que aceitar o fato de que nem sempre o leitor está interessado em livros complexos e com técnicas literárias sofisticadas, tais como: múltiplas vozes narrativas, oscilações no tempo e no espaço, uso de metaficção, personagens com densidade psicológica e tantos outros recursos, experimentais ou não, que os críticos costumam associar à qualidade do texto. Na verdade, muitas vezes o leitor está buscando apenas um romance para ler nas férias, visando unicamente o entretenimento, se for este o caso recomendo Filha da fortuna de Isabel Allende, lançado originalmente em 1999 e relançado agora em 12ª edição pela Editora Bertrand.

Filha da fortuna é um romance histórico ambientado na primeira metade do século XIX com uma trama novelesca cheia de reviravoltas, aventuras em quatro continentes e paixões de tirar o fôlego, tudo isso com personagens carismáticos e uma narrativa veloz e muito visual, ingredientes que garantiram uma excelente vendagem para o livro, tanto é que já está na 12ª edição brasileira. O sucesso de público é um fato muito comum com os livros da escritora Isabel Allende, de nacionalidade chilena e norte-americana, que iniciou sua carreira com o romance A casa dos espíritos em 1982, adaptado com grande sucesso para o cinema em 1993.

Um grande mistério envolve o passado de Eliza Sommers que foi abandonada ainda bebê na porta de uma família inglesa na cidade de Valparaíso no Chile em 1810. Ela foi criada e educada como se fosse da família pelos irmãos Rose e Jeremy Sommers, principalmente pela solteirona Miss Rose, como era chamada por todos, e que não tinha a menor intenção de se casar, pois pensava que "o bom do casamento é enviuvar". O terceiro irmão, John Sommers, passava o maior tempo no mar, atuando como comandante de veleiros e transportando as mercadorias negociadas pela Companhia Britânica de Importação e Exportação no Chile. Eliza, aos dezesseis anos, se apaixona por Joaquin Andieta, um dos empregados do tio adotivo, mesmo sabendo que a relação teria um futuro incerto devido ao desnível social entre eles. 
"Ao longo de seu caminho, perguntaria mil vezes a si mesma se tivera a oportunidade de fugir daquela paixão arrasadora que lhe torceria a vida, ou se naqueles breves instantes poderia ter dado meia-volta e salvar-se, mas, cada vez que fazia essa pergunta, concluía que seu destino estava traçado desde o começo dos tempos. E, quando o sábio Tao Chi'en a introduziu na poética possibilidade da reencarnação, convenceu-se de que o mesmo drama se repetia em cada uma de suas vidas: se houvesse nascido mil vezes antes e tivesse de nascer outras mil vezes no futuro, sempre viria ao mundo com a missão de amar aquele homem, e sempre da mesma maneira. Para ela, não havia escapatória." (Pág. 80)
Em 1849 tem início a corrida do ouro em San Francisco, Califórnia. Estima-se que 300.000 pessoas se deslocaram para a região na época, provenientes do exterior e do leste dos Estados Unidos, um fato histórico que impulsionou o desenvolvimento do país e a conquista do oeste. A ambição de se tornar um milionário em pouco tempo seduziu também muitos aventureiros em todo o mundo, originando o fenômeno da "febre do ouro", inclusive o jovem Joaquin Andieta no Chile, que percebeu a possibilidade de uma rápida ascensão social, o que permitiria o seu casamento com Eliza. Logo, apesar das dificuldades e riscos da empreitada, ele parte para os Estados Unidos, não sem antes desfalcar, em um ato de desespero, a companhia da família Sommers onde trabalhava, como forma de custear a viagem.
"A corrida do ouro era o único assunto das conversas na Europa e nos Estados Unidos, e a notícia já havia chegado até mesmo às longínquas fronteiras da Ásia. Seu navio estava repleto de passageiros que se destinavam à Califórnia; a maioria deles não tinha a menor ideia do que vinha a ser mineração, e muitos jamais tinham visto ouro nem mesmo no dente de alguém. Não havia um modo confortável e rápido de chegar a San Francisco – a travessia durava meses e as condições eram as mais precárias, o capitão explicou – mas, por terra, através do continente americano, desafiando-se a imensidade do território e a agressividade dos indígenas, a viagem demorava ainda mais, e eram menores as probabilidades de alguém chegar lá com vida." (Pág. 128)
Para completar o tom novelesco, após a partida de Joaquin, Eliza descobre que está grávida e embarca clandestinamente, com a ajuda de um chinês chamado Tao Chi'en que havia trabalhado embarcado para o seu tio John Sommers. Ele tomará conta de Eliza no porão de um veleiro, durante a difícil viagem para a Califórnia e acabarão se tornando grandes amigos em San Francisco, na época um vilarejo selvagem onde as únicas mulheres eram as prostitutas. Eliza logo descobre que o seu objetivo de encontrar Joaquin entre os mineiros será muito difícil de atingir, ela terá que amadurecer para sobreviver neste cenário de ambição e violência.
"Nem sempre se chamara Tao Chi'en. De fato, não tivera nome nenhum até os onze anos, pois seus pais eram pobres demais para ocupar-se de semelhantes detalhes: chamava-se simplesmente o Quarto Filho. Havia nascido nove anos antes de Elisa, em uma aldeia da província de Kuangtung, a um dia e meio de distância da cidade de Cantão. Vinha de uma família de curandeiros. Durante incontáveis gerações, os homens de seu sangue haviam passado de pais para filhos os conhecimentos sobre plantas medicinais, a arte de extrair maus humores, a magia para espantar demônios e a habilidade para regular a energia 'qi'. No ano em que o Quarto Filho nasceu a família estava em grande miséria, tendo perdido parte da terra para os agiotas e os donos da jogatina." (Pág. 147)
O livro tem um final um pouco abrupto e deixa algumas pontas soltas, talvez devido ao fato da autora ter lançado um outro romance em continuação, chamado de Retrato em Sépia, sendo a protagonista, Aurora del Valle, a neta de Eliza Sommers. De qualquer forma, Isabel Allende não decepcionará os seus leitores mais fiéis com este Filha da fortuna, onde repete a mesma fórmula de sucesso que fez com que seus livros fossem traduzidos em 35 idiomas, transformando-a na escritora mais lida da América Latina em todo o mundo.

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