Umberto Eco - O Fascismo Eterno

Ensaios, política, sociologia, filosofia
Umberto Eco - O Fascismo Eterno - Editora Record - 64 Páginas - Tradução de Eliana Aguiar - Projeto gráfico de miolo e capa: Leonardo Iaccarino - Lançamento no Brasil: 03/12/2018.

Algumas palavras sofrem um contínuo processo de desgaste devido ao uso indiscriminado e perdem a força do seu sentido original, principalmente no campo político, quando são utilizadas como forma de agressão verbal nos debates eleitorais. Este é um fenômeno que escapa ao domínio da gramática e da etimologia. É o caso do termo "fascismo", definido como uma ideologia política que se apresenta de formas diferentes, mas geralmente associado aos movimentos nacionalistas de extrema direita e regimes de governo totalitários, como foi o caso de Mussolini na Itália, Franco na Espanha, Salazar em Portugal e, é claro, o nazismo, considerado como a expressão máxima do fascismo.

Este livro é o resultado de uma conferência realizada pelo escritor, filósofo e linguista italiano Umberto Eco (1932-2016) na Columbia University em 25 de abril de 1995, para celebrar a libertação da Europa e tenta definir alguns pontos comuns aos regimes fascistas, sintetizados na relação das 14 características típicas desses governos. É importante ressaltar que muitas partes do texto original já circulam na internet há algum tempo mas, como é de praxe nesses casos, com muitas simplificações e descaracterizações, em função do uso político que se pretende alcançar. Logo, é importante conhecer o texto integral para evitar manipulações.
"O termo 'fascismo' adapta-se a tudo porque é possível eliminar de um regime fascista um ou mais aspectos, e ele continuará sempre a ser reconhecido como fascista. [...] A despeito dessa confusão, considero possível indicar uma lista de características típicas daquilo que eu gostaria de chamar de 'Ur-Fascismo', ou 'fascismo eterno'. Tais características não podem ser reunidas em um sistema; muitas se contradizem entre si e são típicas de outras formas de despotismo ou fanatismo. Mas é suficiente que uma delas se apresente para fazer com que se forme uma nebulosa fascista." (Pág. 44)
Muitas das características comuns levantadas por Umberto Eco em 1995 para essa "nebulosa fascista", são facilmente reconhecidas em programas de governo de extrema direita atuais em todo o mundo, tais como: culto da tradição, recusa da modernidade, ação pela ação, medo da diferença, apelo para a frustração individual ou social, nacionalismo exacerbado e apelo à xenofobia, militarismo, desprezo pelos fracos, desdém pelas mulheres e intolerância à homossexualidade. Até mesmo um ponto que me chamou muito a atenção pela antecedência visionária quanto ao uso político das redes sociais: o "populismo qualitativo" de TV ou internet.
"Devemos ficar atentos para que o sentido dessas palavras não seja esquecido de novo. O Ur-Fascismo ainda está ao nosso redor, às vezes em trajes civis. Seria muito confortável para nós se alguém surgisse na boca de cena do mundo para dizer: 'Quero reabrir Auschwitz, quero que os camisas-negras desfilem outra vez pelas praças italianas!' Infelizmente, a vida não é fácil assim! O Ur-Fascismo pode voltar sob as vestes mais inocentes. Nosso dever é desmascará-lo e apontar o dedo para cada uma de suas novas formas – a cada dia, em cada lugar do mundo." (Pág. 61)
Publicado pela primeira vez em 1997, como parte do livro Cinco escritos morais, esta edição lançada agora no Brasil em um pequeno livreto de 64 páginas, que se lê de uma só vez, é fundamental para entendermos melhor o nosso passado recente e reconhecermos as ameaças à liberdade democrática neste início de século; ameaças que muitas vezes podem estar disfarçadas em trajes civis e discursos populistas.

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